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terça-feira, 11 de novembro de 2008

O Ministério Público e o combate ao nepotismo

Terça-feira, 11 de novembro de 2008
http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/58622.shtml
 
Daniel Serra Azul Guimarães, Ultima Instância
 
Recentemente, julgando medida cautelar em ação declaratória de constitucionalidade ajuizada pela Associação dos Magistrados Brasileiros em prol da Resolução 7, de 18 de outubro de 2.005, do Conselho Nacional da Justiça, que estabeleceu restrições à contratação de parentes sem concurso no âmbito do Poder Judiciário com o intento de combater o nepotismo, considerou o Supremo Tribunal Federal que os condicionamentos impostos pela resolução foram mera explicitação de normas já contidas na Constituição, "dedutíveis dos republicanos princípios da impessoalidade, da eficiência, da igualdade e da moralidade".

Insistiu-se em que "o que já era constitucionalmente proibido permanece com essa tipificação, porém, agora, mais expletivamente positivado" (Medida Cautelar em Ação Declaratória de Constitucionalidade. ADC-MC 12 / DF – Distrito Federal. Relator Ministro Carlos Ayres Britto. Órgão julgador: Tribunal Pleno. Julgamento: 16.02.06. Publicação: D. J. 01.09.2006. p. 00015).

Posteriormente, dada a proliferação de demandas sobre o tema, houve por bem o Supremo Tribunal Federal expedir a Súmula Vinculante 13, que dispõe: "A nomeação de cônjuge, companheiro ou parente em linha reta, colateral ou por afinidade até o terceiro grau inclusive da autoridade nomeante ou de servidor da mesma pessoa jurídica investido em cargo de direção, chefia ou assessoramento para o exercício de cargo em comissão ou de confiança ou ainda de função gratificada na administração pública direta ou indireta em quaisquer dos poderes da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, compreendido o ajuste mediante designações recíprocas, viola a Constituição Federal".

Assim, estabelecidos os parâmetros para a interpretação e aplicação do caput do artigo 37 da Constituição da República e dos demais dispositivos constitucionais com ele relacionados, ... pode e deve o Ministério Público, nos termos do artigo 129, incisos II e III da Constituição da República, do artigo 25, inciso IV, da Lei 8.625/93, do artigo 8º da Lei 7.347/85 e do artigo 17 da Lei 8.429/92, instaurar inquérito civil e, se necessário, ajuizar a ação competente, com o fim de combater a funesta prática do nepotismo.

Detectada a presença de parentes de agentes políticos que tenham ingressado sem concurso na administração pública (em qualquer dos Poderes da República), deve-se, inicialmente, tentar a celebração de compromisso de ajustamento de conduta, caso esteja disposto o administrador público a cumprir espontaneamente seu dever-poder de auto-tutela, anulando os atos de investidura dos eventuais parentes, além de comprometer-se a não realizar mais nenhum ato de investidura de parentes, segundo o conceito incorporado pela súmula, sob pena de multa diária e, evidentemente, caracterização de improbidade administrativa, nos termos do art. 10 e, eventualmente, do artigo 9º, ambos da Lei 8.429/92.

Caso relute o administrador público, recusando-se a firmar o compromisso de ajustamento de conduta, necessário o ajuizamento de ação civil pública para tal fim, sendo imprescindível o requerimento e a concessão de medida liminar, sob pena de tornar-se inócuo o instrumento, permanecendo o tripúdio sobre a Constituição até o fim do mandato.

É claro que, diante de cada situação concreta, pode-se conceder um prazo razoável para que as demissões ou exonerações ocorram, desde que imprescindível para evitar maiores prejuízos ao interesse público.
 
Até aqui, nada de novo. Trata-se exatamente do que tem sido feito pelos zelosos membros do Ministério Público por todo o país. Um detalhe, contudo, não pode passar despercebido.

Em primeiro lugar, conforme remansosa jurisprudência, ocupantes de cargos em comissão, exoneráveis ad nutum, não fazem jus, evidentemente, a verbas rescisórias, devendo haver atenção a este aspecto da questão, pois, mesmo sob a aparência de obediência ao ordenamento jurídico, podem os parentes beneficiados receber vultosos valores, em evidente enriquecimento ilícito, as custas do erário. Acrescente-se que nem mesmo indenização de férias não gozadas ou décimo terceiro salário devem ser pagos.

Com efeito, aqueles investidos em cargos em comissão não têm vínculo de emprego com a Administração pública, mesmo que a lei, em ofensa à Constituição da República, assim disponha. Isto seria uma deturpação do instituto constitucional previsto para situações excepcionais em que o vínculo é político e não profissional e o regime é específico.

Conforme tem decidido a Justiça Especial pertinente, "Não é empregado do Município, no estrito sentido de vinculação a relação jurídica de direito privado, o servidor que tenha integrado os quadros da Administração Pública, após 1988, em exercício de cargo em comissão caracterizado pela livre nomeação e exoneração, prevista na última parte do inciso II, do art. 37, da CF/88. desdobramentos de sua relação jurídica e mesmo o débito de verbas em razão da exoneração só podem ser vistos sob a ótica do direito público" (TRT 3ª R. – RO – 794/97 – 5ª T. – Rel. Juíza Mônica Sette Lopes – Publ. MG. 20.02.98 – Revista do TRT 3ª Região nº 58/462).
No mesmo sentido: "RELAÇÃO DE EMPREGO – CARGO EM COMISSÃO – Caracterizado nos autos que o autor exerceu cargo em comissão, de natureza administrativa, o que afasta a possibilidade de reconhecimento de vínculo de emprego nos moldes do art. 3º da CLT" (TRT 4ª R. – RO – 43062.801/94-8 – 3ª T. – Rel Armando Macedônia Franco – J. 17.02.2000); "SERVIDOR PÚBLICO CARGO EM COMISSÃO. A contratação de servidores pela Administração Pública, para o exercício de função comissionada, não gera vínculo de emprego, entre o particular e o Poder Público, mas mero vínculo administrativo, com possibilidade de dispensa 'ad nutum'" (1ª Vara do Trabalho de Passos – Processo nº 769/01 – RO 11371/01 – TRT 3ª Região, 1ª Turma – 18.09.2001).

Assim, mesmo verbas referentes a férias e décimo terceiro salário, como dito acima, são indevidas.

Insta ressaltar que, seja a celebração de compromisso de ajustamento de conduta à lei, seja a determinação judicial em ação civil pública, tem como escopo a adequação entre a prática da administração e a Constituição, tendo em vista a Súmula Vinculante 13 do STF.

A rigor, seria desnecessária a celebração do compromisso de ajustamento ou o ajuizamento de ação, pois deveria a própria administração, espontaneamente, declarar a nulidade da investidura dos parentes em questão, dado o caráter vinculante da súmula, inclusive para a Administração Pública.

Não se trata da demissão de empregados da Prefeitura Municipal, mas do desligamento de agentes investidos em seus cargos em desconformidade com a Constituição, conforme assentado pelo Pretório Excelso. Reitere-se: trata-se de restaurar a legalidade, porque o vínculo entre os parentes dos agentes políticos e a Administração Pública é nulo.

Seria afrontoso ao bom senso cogitar do pagamento das verbas em questão àqueles que ocupam indevidamente cargos públicos.

O desvio de finalidade na investidura dos parentes é presumido, nos termos da Súmula do Supremo Tribunal Federal. Sua presença, aliás é reforçada quando há elevado número de parentes, divididos em número semelhante, como se em cotas, bem como pela presença de grande número de esposos, companheiros, filhos, o que evidencia a usurpação de cargos públicos para aumentar a renda familiar.

Importante foi o passo dado com a expedição da Súmula Vinculante 13, cuja existência deve ser creditada, em grande medida ao Conselho Nacional da Justiça, que expediu a Resolução 7, de 18 de outubro de 2.005, iniciando esta jornada pela impessoalidade e moralidade na administração pública.

Estas duas medidas têm multiplicado efeitos por todo o território nacional, graças à atuação do Ministério Público.

O que se aguarda é que as medidas anti-nepotismo continuem produzindo seus efeitos saneadores até que seja a nefasta prática defenestrada de nossa realidade administrativa, atentando-se para as questões aqui expostas sobre o pagamento de verbas indevidas para que aqueles que se apropriaram da res publica não tenham um prêmio final pela falta de espírito republicano.

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