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quinta-feira, 1 de janeiro de 2009

“Judiciário cria muita indisposição”

“Judiciário cria muita indisposição”, diz Ricardo Barros
Vice-líder do governo mostra como parlamentares ameaçam aumentos de juízes e promotores depois da campanha contra os 'ficha-suja'


Ricardo: “Eles quiseram fazer um 'H', aparecer para a sociedade” (José Cruz/ABr)


O ano de 2008 foi marcado por interferências dos Poderes Executivo e Judiciário nos trabalhos do Congresso. Enquanto o governo Lula não aliviou em termos de medidas provisórias, que chegaram a trancar a pauta da Câmara em mais de 60% das sessões, os ministros de tribunais superiores “legislaram” matérias sobre as quais os congressistas não tinham consenso para deliberar.

Entre elas, a súmula antinepotismo do Supremo Tribunal Federal (STF), que causou desconforto entre deputados e senadores que insistiam em empregar parentes, e a resolução do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) sobre a fidelidade partidária, editada ainda em 2007, que rendeu este ano a cassação de um congressista. Mas o grande impasse entre os Poderes se deu mesmo em torno dos "ficha-suja", lista de políticos processados na Justiça divulgada pela Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) (leia mais aqui).

"A questão dos 'ficha-suja' criou uma indisposição muito grande aqui [no Congresso]. Nós tínhamos um pouco mais de 70 parlamentares concorrendo às eleições municipais e vem a Associação dos Magistrados Brasileiros dizer que quem está condenado em primeira instância é 'ficha-suja'. Que coisa mais idiota! É contra a Constituição a posição da AMB. O Judiciário cria muita indisposição. O Ministério Público ataca demais o Poder Legislativo, o Poder Executivo. E depois eles acham que está tudo bem. E não está tudo bem", disse ao Congresso em Foco o vice-líder do governo no Congresso, deputado Ricardo Barros (PP-PR).

Em entrevista exclusiva ao site, o deputado assume que está instaurado o conflito entre o Legislativo e a Justiça, tantas vezes amenizado em declarações à imprensa – como fizeram os líderes do governo, Henrique Fontana (PT-RS), e do PSDB, José Aníbal (SP), em entrevista ao Congreso em Foco publicada na última sexta-feira.

Ricardo Barros assume que o Congresso não se esforça para votar o reajuste nos vencimentos dos ministros do STF. O parlamentar avisa que, caso queira que o reajuste de 5%, o Judiciário terá que "fazer concessões". Entre elas, "pegar leve" com medidas como a divulgação dos "ficha-suja".

"O que acontece aqui é que nós temos problemas com o Judiciário. Eu já expressei os problemas nas associações de magistrados e, sinceramente, não vi nenhum trabalho deles no sentido de superar isso. Ficam aqui tentando ganhar o aumento na pressão, sem ter que fazer concessões. Não é uma negociação toma lá, dá cá. Mas é a questão da habilidade. Se você quer alcançar um objetivo, tire as pedras do caminho", avisa.

Equiparação salarial

Em seu quarto mandato, Ricardo Barros é também defensor declarado da equiparação salarial entre os Poderes – medida impopular que garante um aumento de cerca de R$ 8 mil para os deputados e senadores, elevando o atual salário de R$ 16.500 com a remuneração dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), R$ 24.500.

O parlamentar afirma que o Congresso tem proposto diversas intervenções no Judiciário. Entre elas, a responsabilização do Ministério Público em relação a denúncias infundadas, o estabelecimento de uma experiência mínima para seguir a carreira de juiz e a volta do recesso no Judiciário.

(...)

PROBLEMAS COM O JUDICIÁRIO

Congresso em Foco - Esse ano legislativo foi marcado pela interferência do Executivo – por meio de MPs – e do Judiciário, que editou súmulas e resoluções, como nepotismo e fidelidade partidária. O senhor acha que o Congresso deixou de cumprir o seu papel?
Ricardo Barros - Acho que, na verdade, muito decorre da dificuldade política que nós temos aqui. Por exemplo, o nepotismo. Para mim, é ótimo, eu não tenho nenhum parente nomeado nos gabinetes, nem minha esposa que é deputada estadual, nem meu irmão, que é prefeito. Para mim, não teria nenhum problema aprovar proposta contra o nepotismo. Mas, para os prefeitos que me apóiam, têm problema. Para os vereadores que me apóiam, também têm. Então isso acontece com todos os colegas aqui. Quando a gente discute a questão do nepotismo, estamos tratando de algo que vai refletir em nossas bases eleitorais. Eu não teria nenhuma dificuldade em votar o projeto sobre nepotismo, mas você percebe que não há ambiente. O conjunto das forças políticas não permite votar. Aí sobra para o Supremo deliberar. Eu ainda prefiro isso do que nada. A súmula do Supremo é melhor do que não ter nada. Ela está fazendo bons efeitos, a sociedade está percebendo resultados em cima disso. É lamentável que o Congresso se omita, mas decorre do processo político. Da incapacidade que nós temos aqui de tomar decisões que nos desgastam perante à opinião pública ou perante a nossa base parlamentar.

A fidelidade partidária e a necessidade de as coligações serem as mesmas nas eleições municipais e estaduais engessam o processo político?
Em relação às coligações, acho que isso é um exagero. Porque durante o período eleitoral, a coligação se torna um único partido. Mas isso é durante o processo eleitoral, depois não. Após as eleições, são desfeitas as coligações para se ter o direito de fazer isso novamente nas próximas disputas. Quanto à fidelidade partidária, vi aqui na Casa colega argumentando: "Eu posso trocar de mulher, trocar de carro, de tudo, e não posso trocar de partido?". Pode, mas sai um ano e três meses antes, entrega o seu cargo para o partido e muda. Se você se separa da mulher, deixa metade do patrimônio com ela. Por que, quando se separa do partido, não pode deixar o mandato para o partido? Então, tem que ser assim. Não pode ficar a coisa do descompromisso. Se não, vamos mudar o sistema e o "distritão", que a gente chama, então os mais votados se elegem. Dessa forma, não precisa de partido. Pode ser candidato independente. Só que isso vai refletir depois em uma dificuldade de coordenar os trabalhos na Casa.

O senhor defende a equiparação salarial entre os três Poderes. Ano que vem vota-se essa proposta?
Acredito que não. Há uma grande resistência da opinião pública. Nós já fizemos aqui um ato da Mesa, fazendo essa equiparação. Lamentavelmente, o Ministério Público e o Supremo derrubaram esse ato da Mesa que tinha fundamento jurídico. Daí fizeram uma "mediazinha", que não precisavam fazer, o Supremo não tem que fazer média com a opinião pública nem com a imprensa. Daí criou-se esse constrangimento. Mas está na Constituição que tem que haver isonomia entre os Poderes. Então um dia quem sabe o Supremo vai querer resolver isso também, como tem resolvido outras coisas para fazer cumprir a Constituição. Os ministros [do Executivo] hoje ganham aí R$ 12 mil. Têm sentido isso? Aqui na Casa, a maioria dos funcionários ganham mais do que isso. Não pode haver essa diferença do Judiciário ganhando R$ 24 mil, os parlamentares R$ 16 mil e os ministros R$ 12 mil. Até porque está escrito na Constituição que deveria haver uma isonomia entre os salários dos dirigentes desses Poderes.

Esse descontentamento é geral entre os parlamentares?
Os parlamentares estão aqui, cada um, por sua decisão. Se se propôs a ser candidato, sabe quanto é o salário. Se quer fazer alguma coisa que dê mais resultado, então que vá fazer. Muitos estão aqui porque gostam de servir à comunidade, porque têm prazer nessa atividade. Muitos estão até também porque são lobistas pessoais, têm grandes empresas e estão aqui para defender os interesses das suas empresas. Ou estão representando setores, são sindicalistas, bancários, agricultores. Eu sou, por exemplo, um desses que foi prefeito e veio para cá com essa visão municipalista. Cada um está aqui sabendo a responsabilidade que tem e não tem que reclamar porque já se elegeu sabendo qual é a regra. Eu não penso que isso vai ser um cavalo de batalha aqui na Casa nem há essa demanda dos parlamentares por aumento de salário.

Se não tem equiparação salarial, também não tem aumento da remuneração do Judiciário. É essa a posição do Congresso?
Eu tenho dito com clareza para os representantes de associações da magistrados e do Ministério Público que essa questão é uma questão difícil de ser resolvida. Ninguém quer chegar para o presidente do Supremo e dizer: "Olha, não vou votar seu aumento", nem falar para o promotor do Ministério Público, porque o MP tem a prerrogativa de te processar e, se não tiver fundamento, não acontece nada com eles. O que acontece aqui é que nós temos problemas com o Judiciário.

Que problemas seriam esses?
Primeiro, a responsabilização do Ministério Público. Não pode ser assim. O promotor faz uma denúncia, divulga na imprensa, faz um escândalo. Depois, se você prova que a denúncia era infundada, não acontece nada com eles. Isso tem que ser resolvido. O Ministério Público tem todo o direito de fazer o que quer, mas tem que responder pelo que faz como todo mundo aqui. Outra questão se refere aos juízes. Eles estão chegando muito verdes na nagistratura. Falta um pouco de maturidade para quem entra na magistratura. Nós criamos aqui um período de três anos de vivência, para que eles pudessem chegar lá com um pouco de experiência. Mas esses três anos viraram cursinho para passar no concurso de juiz. Nós temos que ter juízes que tenham tido vivência da vida para julgar os casos que vêm na mão dele. Não pode chegar lá, saindo da faculdade, dando canetada aí. Se não não vai julgar bem, porque não tem o senso da realidade. Isso é uma das coisas que ouço nos corredores. Então eu tenho manifestado isso. O salário inicial é muito próximo do final, com apenas 5% de diferença. O juiz chega ganhando R$ 22 mil e termina com R$ 24 mil. Então, não há interesse em se aperfeiçoar. Outro ponto que é um problema é a questão das férias do Judiciário. Antes havia o recesso. Depois acabaram com isso e cada um tira férias quando quer. Seria preciso retomar o recesso do Judiciário. O Poder pára um período. A falta de recesso não está ajudando na celeridade que a sociedade espera ter da Justiça.

Pode-se dizer que há um conflito instaurado entre os dois Poderes?
Os parlamentares falam, mas ninguém quer se expor. Temos vários outros problemas que precisam ser resolvidos com o Judiciário. Por exemplo, a questão dos "ficha-suja" criou uma indisposição muito grande aqui. Nós tínhamos um pouco mais de 70 parlamentares concorrendo às eleições municipais e vem a Associação dos Magistrados do Brasil [AMB] dizer que quem está condenado em primeira instância é "ficha-suja". Que coisa mais idiota! A Constituição brasileira diz que ninguém é culpado até transitado em julgado. É contra a Constituição a posição da AMB. O Judiciário cria muita indisposição. O Ministério Público ataca demais o Poder Legislativo, o Poder Executivo. E depois eles acham que está tudo bem. E não está tudo bem. Então tenho, no pessoal, que isso tudo deve ser mudado. Mas é o conjunto das opiniões dos líderes. Quando o assunto chega na reunião dos líderes, para definir a pauta, a matéria não vai à pauta porque um não quer. No dia 17 de dezembro, na hora de votar urgência, todos os partidos se manifestaram contra no painel. Inclusive, para que todo o Ministério Público saiba que eles estão em desacordo com esse aumento de subsídio. Não pelo aumento de subsídios em si. Mas é uma conjuntura que tem que ser negociada.

Há muitos ressentimentos na Casa em relação à questão dos "ficha-suja". O Judiciário tomou uma posição muito arriscada, não?
Eles quiseram fazer um "H", aparecer para a sociedade. O Ministério Público do Paraná, por exemplo, baixou uma norma para os seus promotores pedirem para impugnar o registro dos candidatos à eleição que estivessem em condenação em primeira instância. Isso é contra a Constituição! Agora está aí o TSE [Tribunal Superior Eleitoral] com muitos processos para julgar, porque ficou entupido de serviços com ações que não geraram resultado nenhum. Só trabalho para a Justiça e desgaste para a classe política. Eu sou um crítico dessa decisão e acho a AMB paga um preço também por ter resolvido brigar com a Justiça e com a Constituição brasileira. Não cabe a magistrado afrontar a norma constitucional.

Como resolver o impasse entre os dois Poderes?
O Poder Judiciário deveria constituir uma força de trabalho e vim resolver esses problemas. Eu já expressei os problemas nas associações de magistrados e, sinceramente, não vi nenhum trabalho deles no sentido de superar isso. Ficam aqui tentando ganhar o aumento na pressão, sem ter que fazer concessões. Não é uma negociação toma lá, dá cá. Mas é a questão da habilidade. Se você quer alcançar um objetivo, tire as pedras do caminho. E eles não estão trabalhando para remover esses obstáculos que já foram expressados por mim e por outras pessoas aos seus representantes.O novo presidente da Câmara, quem sabe, possa constituir um grupo de trabalho de parlamentares e representantes do Ministério Público e Judiciário. Vamos fazer um pacote de arrumação, para poder resolver tudo, inclusive, o subsídio.

Um comentário:

Anônimo disse...

Este é o tipo de político que elegemos. Que tem a desfaçatez de sugerir um 'toma lá dá cá' em uma entrevista!!!
Com estes, não dá sequer para negociar.
Tomara que os promotores da região deste político se mobilizem para mostrar aos eleitores do dito cujo o tipo de político que puseram no Congresso Nacional.